O filme mais triste do ano
Philip Seymour Hoffman encarnaria outros desses tipos, pessoas que nos provocavam asco ou pena, que transitavam entre o grotesco e o ridículo, em filmes poderosos como Boogie Nights (1997), Felicidade (1998), Magnólia (1999), O Talentoso Ripley (1999) e A Família Savage (2007). Acho que nunca fez um mocinho, e encarnou vilões ou tipos bem ambíguos em seus raros blockbusters — Missão: Impossível 3 (2006) e a franquia Jogos Vorazes (morreu antes de filmar suas últimas cenas, aos 46 anos). Concorreu ao Oscar de coadjuvante três vezes, por Jogos do Poder (2007), Dúvida (2008) e O Mestre (2012), e ganhou a estatueta de melhor ator por Capote (2005).
Mas o papel que mais me marcou é o de Antes que o Diabo Saiba que Você Está Morto (2007, disponível no Google Play, no Looke e no YouTube), porque este filme de Sidney Lumet é uma dessas pequenas joias que talvez não tenham o amplo reconhecimento merecido. O ator interpreta Andy, que convence o irmão, Hank (Ethan Hawke), a assaltar a joalheria do pai, Charles (Albert Finney), o que seria a solução de seus problemas financeiros e também a oportunidade de um acerto de contas afetivo com o velho. Neste filme engenhoso, com narrativa elíptica, Hoffman tem uma atuação magnífica como um sujeito que é um poço de inadequação e ressentimento, insegurança e ilusão.
Todo mundo tem seu Robin Williams favorito, embora não falte gente que torça o nariz para o ator morto aos 63 anos. Culpa, provavelmente, do seu jeitão histriônico, característica que o talhou para estrelar comédias como a deliciosa Uma Babá Quase Perfeita (1993), a refilmagem do clássico francês A Gaiola das Loucas (1996) e emprestar sua voz a animações — seu Gênio da Lâmpada em Aladdin (1992) inclusive rendeu um Globo de Ouro especial. Mas muitos diretores perceberam que havia uma carga dramática muito interessante. Não à toa, disputou o Oscar de melhor ator por Bom Dia, Vietnã (1987), Sociedade dos Poetas Mortos (1989) e O Pescador de Ilusões (1991), e sua única estatueta, a de coadjuvante, veio por Gênio Indomável (1997).
Williams fez vários outros dramas pelos quais eu tenho carinho, como Tempo de Despertar (1990) e Amor Além da Vida (1998), mas quero destacar um suspense em que ele esteve do outro lado do bem e especialmente contido — não, não é Insônia (2002), de Christopher Nolan, em que contracenou com Al Pacino e Hilary Swank. Trata-se de Retratos de uma Obsessão, também lançado em 2002, por Mark Romanek. Ali, o ator encarna Seymour Parrish, funcionário cinquentão do quiosque de revelações instantâneas de uma grande loja de departamentos. Solitário e opaco, o homem elege uma família feliz para ser a "sua": faz uma cópia a mais de cada foto, para alimentar sua fantasia. Na pele de vilão, Williams derrubou o preconceito de que era vítima: a quem só o via como bufão e bonzinho, revelou uma faceta minimalista e macambúzia. Sem apelar para a histeria, perturbou.