
Os primeiros raios do sol começavam a iluminar a estrada enquanto José Locatelli já estava em curso, explorando os caminhos da Rota dos Capiteis. Acordar antes do dia nascer e percorrer 33 quilômetros diários: essa foi a rotina do garibaldense por 10 dias. Zé, como é conhecido, foi um dos primeiros a concluir o roteiro de peregrinação da Serra, inaugurado no início de maio.
O percurso começou em 7 de maio, apenas um dia após a rota ser oficialmente inaugurada. Zé acompanhava o andamento do projeto desde o ano ado, aguardando a oportunidade para, literalmente, colocar o pé na estrada na região.
— Fiquei sabendo desse caminho em dezembro do ano ado. Quando falei que ia percorrer a Rota dos Capiteis logo depois da inauguração, uma amiga brincou que eu deveria ir devagar, porque ia chegar antes da empresa instalar as placas — se diverte.
Com uma mochila, água e um pequeno terço em mãos, ele finalizou no último sábado, dia 17, os 330 quilômetros do circuito que inicia e finaliza em Bento Gonçalves. Pelos cálculos dele, foram 78 horas e 40 minutos de caminhada pelas 10 cidades da região.
Aos 67 anos com pura energia, como se autodescreve, Zé encarou a Rota dos Capiteis como uma nova experiência na região em que nasceu e vive. Isso porque apesar de conhecer os caminhos percorridos, a peregrinação despertou lembranças e garantiu novas amizades pela estrada.
— Tinha momentos que me sentia muito longe de casa, apesar de estar a apenas 40 quilômetros. As paisagens são muito lindas e o pessoal valoriza quem está na estrada. Muitas pessoas nem sabiam da Rota, então eu parava para conversar. Em questão de minutos parecia que a gente era amigos há anos e daqui a pouco já se falava em talian — conta.
Depois da meta diária alcançada, Zé pernoitava em pousadas ou na casa de familiares na região. Segundo ele, esse era um dos momentos mais importantes do dia: beber chimarrão que carregava na mochila, tomar banho e se preparar para o próximo dia de caminhada.
Nos 10 dias em que esteve caminhando na região, nem mesmo a chuva foi um impeditivo. Pelo contrário, ao menos oito horas foram percorridas com a capa e guarda-chuva. Uma prova que o desafio exige equilíbrio físico e mental para ser realizado.
— Em primeiro lugar é preciso estar preparado mentalmente. Tendo a cabeça preparada, o corpo tu convence. Durante a caminhada tem momentos que eu não penso em nada, depois dou uns gritos, canto, mas nunca desanimo. É sempre eu e Deus na estrada — revela.
Com o desafio de casa concluído, Zé se prepara para voltar à estrada em agosto, em um circuito em São Paulo. Mas para quem planeja se aventurar na Rota dos Capiteis, o experiente peregrino indica programar as paradas e pernoites e sair sem pressa de terminar o roteiro.
— É desafiador porque tem bastante morros, mas também é muito saudável. Os caminhos estão bem sinalizados, as estradas estão boas e tem muita tranquilidade no trajeto. Vão firme! — recomenda.
O começo da jornada
Há cinco anos, Zé e o filho Felipe participaram de uma corrida em Bom Princípio. Nesse episódio, ele casualmente subiu ao pódio. Desde essa experiência, seguiu praticando a corrida até que decidiu elevar o desafio e começar as peregrinações.
Nos últimos anos ele:
- percorreu três vezes o Caminho Sagrado, circuito de 170 quilômetros sul de Santa Catarina;
- fez duas vezes o Caminho de Caravaggio, com 200 quilômetros entre Canela e Farroupilha;
- caminhou pelo Vale Europeu, percurso de 200 quilômetros que a por nove cidades do Médio Vale do Itajaí, SC;
- finalizou o Caminho da Fé, trajeto de 300 quilômetros que parte de Águas da Prata (SP) e termina em Aparecida (SP);
- concluiu o conhecido Caminho de Santiago de Compostela, de 800 quilômetros na Galiza, Espanha.
Sobre a Rota dos Capiteis

O roteiro é o primeiro que une a Serra Gaúcha e Vale do Taquari em uma experiência religiosa e turística. O percurso a por 23 grutas, 252 capiteis, 16 igrejas, 175 capelas e duas ermidas. Os símbolos da religiosidade são uma herança de imigração italiana na região, que nesse ano, completa 150 anos.
O trajeto a pelas cidades de Bento Gonçalves, Boa Vista do Sul, Carlos Barbosa, Coronel Pilar, Farroupilha, Garibaldi, Imigrante, Monte Belo do Sul, Pinto Bandeira e Santa Tereza. A Rota dos Capiteis pode ser feita tanto a pé, quanto de bicicleta ou carro.
Curiosidades
- Durante a caminhada na Rota dos Capiteis, Zé ou por 48 igrejas e 62 capiteis;
- Zé já foi interpelado diversas vezes por pessoas que questionam se ele está pagando promessas. Segundo ele, as caminhadas são feitas pelo simples prazer;
- Na mochila que carrega consigo durante os trajetos, ele costuma levar algumas mudas de roupa, apenas um tênis, capa de chuva, guarda-chuva, cuia e erva para preparar chimarrão;
- Zé costuma usar tênis feitos com tecidos leves, mais fáceis de secar. A estratégia ajuda nos dias chuvosos;
- Além dos 800 quilômetros Caminho de Santiago de Compostela, Zé seguiu a caminhada por mais 170 quilômetros, fazendo uma extensão do percurso. No total, foram 28 dias caminhando.