Discordância sobre prisão de PM que matou colega provoca atrito entre entidades de delegados e oficiais da BM
— Para vocês, não.
Mais de uma vez, os policiais militares pedem que ele “siga o procedimento”. Sem alterar o tom de voz, o escrivão continua repetindo que é policial e pedindo para buscarem seus documentos ou procurarem seu nome no sistema.
— Não interessa se é da Civil — disse um policial.
— Claro que interessa — respondeu. — Eu sou colega, eu também estou na rua, sou da investigação. Não estou fazendo nada errado.
Depois de mais de três minutos, os policiais militares usaram a força para virá-lo de costas, algemam-no e derrubam no chão.
O caso gerou forte repercussão entre policiais civis. Isaac Ortiz, presidente do Sindicato dos Escrivães, Inspetores e Investigadores de Polícia Civil, divulgou um vídeo repudiando “a maneira desrespeitosa e truculenta” como foi feita a abordagem. Ele pediu respostas à Secretaria de Segurança Pública (SSP), ao governo do Estado e ao Comando da BM. A GZH, Ortiz destacou:
— A gente espera que sejam proibidos os abusos. Os policiais tinham todas as condições de fazer a identificação de uma maneira mais tranquila, ele apontava onde estava a documentação. E é a prerrogativa do policial andar armado, ele estava trabalhando, fazendo a abordagem de um criminoso com ficha extensa de crimes — disse.
A Associação dos Delegados de Polícia do Rio Grande do Sul (Asdep-RS) também publicou nota de repúdio. “O Escrivão de Polícia desenvolvia discretamente sua missão constitucional quando, de forma criminosa, desrespeitosa, intolerante, desqualificada, despreparada foi abordado por aproximadamente dez Policiais Militares que mesmo advertidos de que se tratava de um Policial Civil, agiram covardemente de forma agressiva, humilhando e algemando o agente policial sem qualquer necessidade.” A nota, assinada pelo presidente da entidade, Fernando Edison Domingues Soares, pede ainda o afastamento dos PMs que participaram da abordagem.
O comandante do 9° BPM, tenente-coronel Alex Sandre Pinheiro Severo, destaca que o escrivão se identificou como policial, mas não portava documentos. Como uma pessoa armada que, na abordagem, não pode provar sua identificação, foi submetido a um procedimento padrão, segundo Severo, colocado contra a parede e desarmado.
— Não podemos deixar uma pessoa que não sabemos quem é armada durante uma abordagem — justifica o comandante.
Severo afirma que, “de maneira sumária”, não identificou nenhum erro na abordagem. Mas, em razão das reclamações, vai ser aberto um procedimento de apuração para verificar toda a ação de abordagem.
A Associação dos Oficiais da Brigada Militar e do Corpo de Bombeiros Militar (ASOFBM) publicou nota após as manifestações das entidades que representam os policiais civis e delegados. No documento, assinado pelo presidente da entidade, coronel Marcos Paulo Beck, a ASOFBM afirma que "repudia a falta de postura e de ética dessas manifestações, que sequer aguardaram os esclarecimentos do que efetivamente ocorreu".
De acordo com a SSP, “esse episódio é absolutamente isolado e já está sendo apurado e solucionado no âmbito das próprias instituições vinculadas, Polícia Civil e Brigada Militar". Por meio da assessoria de imprensa, a pasta também defendeu que o ocorrido “em nada altera a premissa de integração que tem marcado a atuação das forças de segurança, fator essencial para as reduções da criminalidade que se comprovam nos indicadores divulgados”.